20/07/2009

Memórias III

Decorria o dia 25 de Abril de1991 (ou pelo menos era fim-de-semana prolongado devido ao feriado) e lembro-me desse acontecimento, como se fosse uma revolução, não de cravos, mas dos vermelhos de Lisboa, na deslocação às Antas.
Estava em Melgaço, em casa daqueles que viriam a ser meus padrinhos de casamento e preparava-me para apanhar o expresso para Lisboa, quando começava o FC Porto - Benfica. Só depois é que vieram a lume as famigeradas histórias de Guarda Abel, balneário impestado, ameaças físicas, etc, tudo ingredientes próprios de um filme da saga do Padrinho, do que propriamente de um jogo de futebol.
No decorrer da viagem até ao Porto, que na altura demorava duas horas, o relato do jogo em pleno autocarro. As minhas unhas iam sendo roídas ao mesmo tempo que o jogo se desenrolava. E quando César Brito marcou os dois golos, os meus pais, pacientemente, pediram para eu me acalmar aquando do festejo dos mesmos.

Do Porto até Lisboa, foi um prazer ver os carros na direcção da capital com as bandeiras do Benfica na janela, orgulhosamente exibidas com a sensação do dever cumprido.
Mais tarde, quando a história foi contada, viu-se que a vitória daquela equipa, nas condições em que foi, foi de heróis, daqueles valentes, que vão para uma guerra e que saem de lá todos incólumes e transformados em ícones.
Para além da vitória, foi a demonstração do poder do Benfica, da força do clube na altura e da importância que teve.

É esse Benfica que quero ver novamente. É esse Benfica que perdura nas minhas memórias...

19/07/2009

Os troféus

O Benfica ganhou ontem o Torneio do Guadiana. Já o tinha ganho em 2002 e em 2007. O que é que quer dizer isso em termos práticos? Nada!

Porque nesses anos, quem ganhou o Campeonato foi o FC Porto!

E aí está a diferença. É raro o FC Porto participar em torneios, e mesmo assim quando participa, não os ganha. Porque as presenças em torneios serve para criar rotinas, aprimorar métodos de jogo e fazer com que a equipa mostre alguma solidez atacante e defensiva.

Nos últimos anos tem sido assim. O Benfica ganha os troféus de Verão e os outros os troféus de Inverno / Primavera. E o Benfica que eu conheço e conheci não é o Benfica dos troféus de Verão. É o Benfica dos troféus de Inverno / Primavera.

É o Benfica que mostra solidez, força e convicção de que é o maior de Portugal e que para manter esse estatuto tem de ter uma forte personalidade e fazer-se respeitar. Foi assim com várias equipas, foi assim com vários Presidentes e é assim que mostra que é uma equipa capaz.

O Benfica dos troféus é o Benfica que enche o Jamor, é o Benfica que enche o Estádio da Luz e os demais, é o Benfica que movimenta a economia do país.

Obviamente que é bom que ganhe troféus de Verão, mas não faça disso uma prioridade, senão, os troféus de Inverno / Primavera serão dos outros...

16/07/2009

Memórias II

Em 1990, quando me fiz sócio do Benfica com 12 anos, tinha a secreta esperança de poder ir ver os jogos sozinho à Luz. Havia um grande problema. morava na Margem Sul e nem os meus pais eram muito aficionados da bola, nem me deixavam ir sozinho para Lisboa.
Só ia acompanhado por pessoas mais velhas e foi assim que em 1991 vi o Benfica ganhar 3-1 ao Beira-Mar na última jornada e vi Rui Águas sagrar-se Bola de Prata, numa luta com Domingos, que só na última jornada marcou 4 golos e estava quase a ameaçar o nosso "matador" da altura.
Porém, dois anos depois, com maior autonomia comecei a convencê-los paulatinamente que iria à Luz sozinho, quisessem eles ou não.
Para ir para Lisboa, tinha de fazer o seguinte percurso. Apanhava o autocarro na Margem Sul até Cacilhas, de lá apanhava o barco até à Praça do Comércio, fazia a pé a Rua Augusta e apanhava o metro nos Restauradores em direcção ao Colégio Militar.
Não havia metro no Cais do Sodré ou na Praça da Figueira, não havia comboio na ponte, nem as facilidades que existem hoje em matéria de transportes.
A rotina era quase sempre a mesma. Aproveitava-se também o facto de haver jogos com bilhetes de sócio, que na maioria das vezes, não se pagava, e lá ia eu todo contente para o Estádio, para o sector dos sócios acompanhar o Benfica.
Vi nascer os No Name Boys, vi acabar a Raça Benfiquista, mas vi sobretudo crescer a minha capacidade de "desenrasque" ao ir para a Luz sozinho ver o Glorioso.
Depois do jogo, nova epopeia no regresso a casa. 2 horas de e para a Margem Sul, ou seja, 4 horas perdidas em transportes com um único objectivo: ver o Benfica na Catedral e ganhar. Era isso que me movia...

14/07/2009

Memórias I

Corria o ano de 1993 e Portugal acordava abalado numa noite de Verão. Paulo Sousa e Pacheco tinham rescindido o contrato com o Benfica, assim como João Vieira Pinto. O Sporting, prontamente se predispôs a acolher os três jogadores. Paulo Sousa e Pacheco assinaram em Alvalade quase no mesmo instante em que o fax com a rescisão de contrato tinha chegado à Luz. João Pinto andava em parte incerta.
O resto da história é conhecida e convém relembrar uma situação que só há pouco tempo foi escrita. Rui Costa recusou a oferta de Sousa Cintra, porque não queria abandonar o clube que o acolheu aos 10 anos. Rui Costa é da Damaia, bem pertinho da Luz. Paulo Sousa é de Viseu e Pacheco é do Algarve. Vontades...

Ficou Toni, o do costume, quando a crise apertava para os lados da Luz. Era um homem da casa, conhecia bem os cantos e sabia o que era a "mística" do clube. A "mística", essa palavra tantas vezes dita sem se saber exactamente o que ela vale.

Nesse ano, o Benfica anda aflito. Não tinha dinheiro, era o mais fraco dos três grandes, estava na penúria e seria muito difícil ganhar o campeonato. Ainda por cima, tinha muitos ex-juniores, como Nuno Afonso, Kennedy e Pedro Henriques, para além de ter conseguido manter João Pinto e ter ido buscar ao Brasil um rapaz chamado Ailton, que ninguém conhecia. Estava traçado o destino, e segundo as crónicas da altura, o Sporting ia limpar o campeonato sem espinhas.

Porém, logo na primeira jornada, havia um FC Porto - Benfica, e a exibição da equipa de vermelho foi das mais excitantes que vi, nos últimos anos, em covil adversário. 3-3 foi o resultado final com um Isaías já a provar que o Benfica não iria abaixo como queriam que ele fosse.

Segunda jornada e recebíamos o Estoril em casa, a horas em que havia sol e não havia transmissões na TV. Presa fácil, dizia-se na altura, com uma equipa a vir da 2ª divisão e depois de ter empatado nas Antas, a goleada era o mínimo. Novo empate, desta vez a 2. E logo começaram os discursos da desgraça, da penúria, de ser uma equipa fraca e sem espírito capaz de aguentar o campeonato inteiro. O discurso estava pronto e a matança quase a completar-se.

E a terceira jornada deu outro empate, desta vez com o Beira-Mar. 3 jogos, 3 empates, 3 pontos. O destino estava fatalmente traçado, só que da 4ª à 10ª Jornada, o Benfica começou a engatar e a vencer, com algumas dificuldades, mas vencia. O estigma do Toni, da vitória sobre o apito final, que sempre considerei vitória do querer, da conquista, da procura da glória.

Até que apareceu Yekini e em três golos desbaratou a equipa que ia em ritmo de vitória. Copiosamente derrotado em Setúbal por 5-2, Toni decidiu que o seu esquema iria ter um "trinco" e em boa altura pensou. Kulkov foi o eleito e o pêndulo que guiava a equipa. Suportava Rui Costa no meio-campo, tinha Paneira na direita e Isaías na esquerda, João Pinto no apoio ao avançado que tanto era Ailton, como Yuran ou ainda Rui Águas. A equipa carborava e conseguiu 7 vitórias seguidas, destacando-se uns 5-1 em Famalicão.

Ao mesmo tempo, na Europa, a passada era longa e estava bem encaminhada. Toni dava-se ao luxo de colocar jogadores e a equipa não se ressentir, levando pessoas à Luz, sempre com a ânsia de vencer.

A época acabava com o 6-3 de Alvalade e com a criação do ícone João Vieira Pinto, que como sempre, no Benfica, só quando morrer, será lembrado como um dos que mais fez para dignificar a camisola encarnada, enquanto outros a tentavam denegrir.

Lembrar resultados como os 2-0 ao FC Porto em casa, os 2-1 ao Sporting, também em casa, os 4-4 de Leverkusen, os inevitáveis 6-3 de Alvalade, os 8-0 ao Famalicão, não foram obra do acaso.

Foram obra de Toni (que uniu o plantel, quando era mais preciso), de Veloso (que era o avô dos meninos), de um menino chamado Rui Costa (que aprendeu de vez o que era o Benfica), de um senhor chamado Vitor Paneira, de um Mozer (que dava umas chapadas quando era preciso) e de outros, que apesar de serem menos importantes, foram-no na medida exacta.

O campeonato de 1993/94 teve esse condão. De mostrar do que é feito o Benfica, pelas pessoas que gostam do Benfica. Da procura pela mística e pela paixão que deram ao clube, em cada dez anos, deveriam ser homenageados. Pelo que deram e pelo que poderiam dar ainda, se lhes dessem oportunidade...

O ADN

Tinha 6 anos quando fui pela primeira vez à bola. Era e é assim que se diz: "Ir à bola!", não é ver futebol, apreciar o futebol e falar em transições, basculações e outras "ões", que tiram o verdadeiro valor da bola. Daquilo que nos faz andar quilómetros para vermos o clube de eleição, das discussões à segunda-feira inconsequentes à espera de uma segunda volta na segunda-feira seguinte. É isso o "Ir à bola!".
E lembro-me bem onde foi. Ao Estádio do Restelo. Como na altura morava mais com os meus avós do que com os meus pais, o meu avô materno lembrou-se de me levar de Algés ao Restelo, a pé. Para ver o Benfica. A meio do caminho, a compra da bandeira, em vermelho vivo, com um pau de madeira, tendo o símbolo do clube rodeado por uma coroa de louros em tons amarelados, como que a prestar homenagem a um imperador, que neste caso, era representado pelo símbolo do maior clube português.
De caminho e em passo apressado, tentava descobrir o que é que, para além de mim e do meu avô, aquelas pessoas ao meu lado, faziam em 1984, num domingo à tarde, a subir a Av. das Descobertas com o objectivo de ver um jogo de futebol e qual a importância. Obviamente, que celebrei o golo de Maniche e vi o Belenenses empatar. Mas o objectivo das pessoas, só senti dois anos mais tarde.
E com o mesmo avô, com a ainda sua "doença" vermelha, nos pusemos a caminho do Estádio da Luz, para vermos a meia-final da Taça dos Campeões Europeus (só lá jogavam os Campeões) contra o Steaua de Bucareste, é que senti o mesmo que as outras pessoas.
Os dois golos do Rui Águas, a informação no placard electrónico de que, ao intervalo, o PSV estava em vantagem perante o Real Madrid na eliminatória, fazendo-nos sonhar no terceiro caneco e as emoções no final do jogo, com os festejos, fizeram com que tomasse a decisão que ainda não tinha tomado: ser do Benfica!
E entender que para ser do Benfica, era preciso ser mais do que festejar, era necessário ganhar, e se não fosse por mais de 4, era porque a nossa exigência era fraca e ficaríamos habituados a pouco, diminuindo assim a nossa exigência.
É por isso que mesmo que o Benfica ganhe e bem, há sempre algo que tem de ser mudado. Há sempre algo para acrescentar, porque a goleada não foi à Benfica.
É esse o ADN!
É esse o espírito!

Vermelha é a cor

Da paixão, do amor, do Benfica, da groselha, dos comunistas, das papoilas, do sangue!

Vermelha é a cor cativa neste local plantado pelas palavras singelas que irão ocorrer.

Vermelho é este cativo, onde me sento para contar o mundo, as histórias e tudo o que nos rodeia.

Bem-vindos!